Maria Rita decidiu encerrar oficialmente a turnê Redescobrir
– na qual cantava canções de sua mãe, Elis Regina – no último sábado, 20 de julho,
no Credicard Hall, em São Paulo.
O show ficou pouco mais de um ano em cartaz e a história
dele é bem conhecida. Mas, recapitulando, brevemente: começou com o nome Viva
Elis dentro de um projeto criado pelo produtor João Marcello Bôscoli, irmão de
Maria Rita, para marcar os 30 anos sem Elis. A ideia, que também abarcava uma
exposição e um livro biografia (ainda não lançado comercialmente) sobre Elis,
foi comprada pela empresa Nivea, que patrocinou cinco shows gratuitos nas
principais capitais brasileiras.
Com a boa recepção do projeto, Maria Rita decidiu, segundo
ela, por conta dos inúmeros pedidos de fãs que queriam ver o show,
transformá-lo em turnê. E mais: em CD e DVD registrados ao vivo em 11 de agosto
de 2012, em São Paulo, que inauguraram seu contrato com a gravadora Universal.
‘Mercenária’, bradaram alguns. ‘Está imitando a mãe’,
disseram outros. ‘Esse show é um karaokê, disseram- me alguns amigos e colegas
de profissão (todos profissionais qualificadíssimos – e viva a diferença de
opinião!), diante da minha empolgação com o show.
Jair Rodrigues – antigo parceiro da Elis – mandou Maria Rita se achar. O crítico Zuza Homem de Mello disse que o projeto é uma “inutilidade absoluta.”
Alheia a tudo isso, Maria Rita seguiu. Deu a cara à tapa,
mesmo sabendo que ficaria à sombra da mãe no palco. Inevitável. E duvido que
ela mesma não tivesse absoluta certeza disso. “Estou aqui mais como filha do que
como cantora”, avisava a cada apresentação.
Assisti ao show sete ou oito vezes. Uma logo no início, em
Porto Alegre, ainda com o nome Viva Elis. Vi a gravação do DVD. Estive no
último show da turnê. Sempre fui, como disse no passado, esperando ver Maria
Rita cantando músicas da Elis. Nada além disso.
Redescobrir fez mais bem do que mal a Maria Rita. Trouxe amadurecimento
para a cantora. Traquejo. Pelo desafio, foi preciso se superar. Alguns
exemplos: se nas primeiras apresentações ela parecia não ter mergulhado no
turbilhão emocional da difícil Bolero de Satã (Guinga/Paulo César Pinheiro), ao
longo da turnê ela foi ficando à vontade nos versos e na melodia que, no
passado, foram cantados por Elis em dueto com o mestre Cauby Peixoto. Tatuagem (Chico Buarque/Ruy Guerra),
que me pareceu muito estranha na apresentação de Porto Alegre, foi outra que
entrou no eixo ao longo da turnê. Essa última, aliás, virou ‘momento suspiro’
do show.
Há que se destacar a excelente forma vocal de Maria Rita. Na
gravação do DVD, depois de um show de quase duas horas, voltou ao palco para refazer
algumas canções. Repetiu várias vezes. Talvez tenha cantado por quase três
horas. Nenhum sinal de cansaço.
A voz da Maria Rita também ganhou potência. A
maturidade está lhe trazendo tons mais graves.
Avessa a polêmicas e quase obsessiva com sua privacidade,
nem mesmo a troca de empresário no meio da turnê (saiu Cajaíba Jr e entrou
Marilene Gondim, profissional que também cuida da carreira de Ana Carolina) - e essas
trocas costumam ser traumáticas ou combustíveis para manchetes – foi percebida.
A turnê seguiu sem problemas.
Perfeccionista, a cantora se cerca, não só de uma competente
produção, como também de grandes músicos. Liderados por Tiago Costa (piano e
teclados), Davi Moraes (guitarra), Cuca Teixeira (bateria) e Sylvinho Mazzucca
(baixo acústico e elétrico) sempre mostraram competência.
Mas o que vem agora? Maria Rita disse, em algumas
entrevistas, sem revelar maiores detalhes, que já tem projetos, que está
selecionando repertório. Embora eu sinta que ela tenha muita vontade de fazer
algo parecido com o Samba Meu (seu terceiro disco), torço para que ela não caia
nessa tentação e faça algo mais próximo do seu primeiro trabalho (Maria Rita,
2003) ou do Elo (2011,disco que precedeu o Redescobrir).
Com um disco/show mais centrado em suas interpretações – sem
a grandiosidade do Samba meu (o show) e sem a sombra de Elis no palco – Maria Rita
poderá dar continuidade a sua evolução como cantora, manter o público que
conquistou com o Redescobrir – e ele era visivelmente diferente do Samba Meu –
e reconquistar os anti-Redescobrir.
A tarefa não será fácil.
Maria Rita canta Madalena no último show da turnê Redescobrir
P.S. Duas ou três sugestões para Maria Rita:
Inevitavelmente, mesmo com um novo trabalho, Maria Rita terá
que seguir cantando uma ou outra música da Elis em seus shows. Além de Doce de
pimenta, talvez a canção que a Maria Rita mais assumiu no Redescobrir - e ela
não deveria abandoná-la - sugiro que ela grave Giro (Antonio Adolfo/Tibério
Gaspar), lançada por Elis em 1969. Tem a cara dela, reparem.
Outra: gravar Sol de primavera, do grande (e esquecido)
compositor mineiro Beto Guedes. “Quando entrar setembro/e a boa nova andar nos
campos”. O motivo? Muito especial. Mas, esse, não conto.
Fotos gentilmente cedidas por Janaina Uribe